Com o sucesso e a expectativa em torno de It: Bem-vindos a Derry, voltou à tona uma enxurrada de “explicações” sobre a Coisa. O problema é que muita gente está explicando It com base no que viu no cinema ou na série, e não no que está escrito no livro do Stephen King. O resultado é um monte de conceito inflado, errado e repetido como verdade absoluta por influencers e perfis grandes.
O livro It – A Coisa não diz em nenhum momento que a Coisa é onisciente, onipresente ou que enxerga passado, presente e futuro ao mesmo tempo. Pelo contrário. O próprio Stephen King deixa claro que a entidade tem limites. Essa ideia de “ser que sabe tudo, vê tudo e está em todo lugar” vem muito mais de leitura apressada e das adaptações para TV e cinema do que do texto original.
A Coisa não sabe tudo
It não é onisciente. O que ele faz é invadir mentes, principalmente de crianças, ler medos, traumas e emoções profundas. Isso cria a ilusão de que ele sabe mais do que realmente sabe. Mas ao longo do livro, It é surpreendido várias vezes. Ele erra, subestima os Otários e entra em pânico no confronto final.
Se fosse onisciente, nada disso aconteceria. Uma entidade que sabe tudo não comete erros básicos, não é enganada e não reage com medo quando encurralada. Mas It reage. E reage mal.
A Coisa também não está em todo lugar
It não é onipresente. Ele não age livremente fora de Derry e ainda depende de ciclos de hibernação de cerca de 27 anos. Derry funciona quase como um ninho, uma âncora física e metafísica da criatura. Se fosse onipresente, não teria território, não precisaria “dormir” e não dependeria de ciclos.
Isso está no livro. Não é interpretação, é texto.
“Mas ele vem do Macroverso”
Sim, It vem de fora da nossa realidade, do Macroverso. Mas isso não faz dele um deus absoluto. No universo do Stephen King existem outras entidades antigas e cósmicas, como Maturin, a Tartaruga, e nenhuma delas é retratada como toda-poderosa.
Ser extradimensional não significa ser infinito, invencível ou acima de qualquer regra. Todas essas entidades têm limites claros dentro da mitologia do King.
O erro mais repetido: It e o tempo como em Interestelar
Aqui está o erro mais gritante que surgiu após o último episódio da série. Tem gente dizendo que It vê o tempo como o Cooper em Interestelar, enxergando passado, presente e futuro ao mesmo tempo, como se estivesse no tesseract.
Isso simplesmente não existe no livro.
It tem uma percepção temporal diferente da humana porque é muito antigo, tem memória profunda e percebe padrões ao longo de ciclos. Ele trabalha com probabilidades, leitura emocional e experiência acumulada. Isso cria a ilusão de que ele “sabe o que vai acontecer”.
Mas ele não vê o futuro. Ele não observa o tempo como um todo. Ele não domina o tempo como uma dimensão física. Ele está preso ao fluxo temporal do mundo físico, mesmo sendo uma criatura extradimensional.
Se fosse como o Cooper em Interestelar, os Otários nunca teriam chance. It não erraria, não seria enganado e não entraria em desespero no confronto final. No livro, ele reage aos acontecimentos. Ele não controla tudo.
O verdadeiro limite da Coisa no livro
O livro é direto sobre isso: It depende do medo, da crença e da imaginação das vítimas para existir e agir plenamente. Quando os Otários crescem, enfrentam seus traumas e enfraquecem a crença, a Coisa perde força.
No Ritual de Chüd final, It sente medo, tenta fugir, é ferido e morre. As Deadlights se apagam. Isso é literal e simbólico no texto do Stephen King. Não há ambiguidade aqui. It não “hiberna”, não “se afasta” e não “fica esperando voltar”. Ele morre.
Onde a série exagera e cria confusão
Pra fechar, é importante deixar isso muito claro: essa ideia de que It vê o tempo inteiro, sabe tudo ou tem acesso absoluto às informações foi simplesmente colocada na série. Não é oficial e não vem do livro.
Cenas como a da Margie, da Coisa passando informações e citando o Richie como se tivesse conhecimento total, são invenções da adaptação. Isso é viagem total. Superestimaram a Coisa para criar um terror mais abstrato e impressionar visualmente.
O problema é que muita gente passou a tratar isso como cânone literário e agora tem influencer “explicando” It completamente errado.
Stephen King nunca escreveu It como uma entidade infinita, onisciente ou fora do tempo. Ele escreveu uma criatura poderosa, sim, mas limitada, falha e, no fim, mortal.
E é justamente isso que muita gente parece ter esquecido agora que Bem-vindos a Derry está em evidência.











