Quando casais se tornam mais amigos do que amantes: causas, consequências e soluções

Um dos maiores desafios dos relacionamentos longos é manter viva a chama da paixão. A amizade é fundamental para a vida a dois, mas quando se torna o único elo, o casal passa de parceiros amorosos a meros colegas de apartamento.

Essa transição geralmente não acontece de uma hora para outra. É um processo silencioso, alimentado pela rotina, pela falta de diálogo e, principalmente, pela diferença no desejo sexual (libido) entre os parceiros.

Neste artigo, você entenderá:

  • Por que isso acontece
  • Como a falta de libido afeta a intimidade
  • O impacto do uso excessivo de redes sociais
  • As consequências emocionais
  • Soluções práticas para recuperar o vínculo íntimo

1. Quando a amizade supera o desejo: como começa?

Segundo a sexóloga Carmita Abdo, coordenadora do Projeto Sexualidade (ProSex) do Hospital das Clínicas da USP, a amizade entre casais é positiva, mas “sem o componente erótico, o casamento perde sua essência” (Abdo, 2004).

Fatores que causam esse esfriamento:

✔️ Foco exagerado na carreira:
Um dos parceiros passa a priorizar ascensão profissional, estudos e conquistas individuais, deixando o relacionamento em segundo plano.

✔️ Excesso de responsabilidades e estresse:
Filhos, dívidas, problemas familiares e preocupações diárias drenam a energia emocional, causando cansaço físico e mental que reduz a libido.

✔️ Uso compulsivo de redes sociais e celular:
Estudos mostram que o uso excessivo de dispositivos móveis é diretamente proporcional à insatisfação sexual (Journal of Sex Research, 2017). O cérebro se acostuma à dopamina rápida do feed, perdendo interesse por estímulos afetivos reais.

✔️ Problemas hormonais ou de saúde:
Depressão, ansiedade, menopausa, andropausa e doenças crônicas alteram o desejo sexual.

✔️ Conformismo e zona de conforto:
O casal deixa de se esforçar para seduzir e agradar, acreditando que o amor está garantido pela convivência.

✔️ Comunicação falha sobre desejos e fantasias:
A vergonha de expor preferências íntimas leva ao tédio sexual, pois o outro não sabe o que você gostaria de viver.


2. Quando somente um quer reviver os velhos tempos

É comum que apenas um dos parceiros queira reacender a vida sexual, enquanto o outro:

  • Prefere dormir ou ver séries
  • Foca em redes sociais
  • Busca satisfação apenas no trabalho ou estudos
  • Recusa carícias com justificativas constantes (cansaço, falta de tempo)

Esse descompasso é chamado de Desejo Sexual Hipoativo Situacional, quando ocorre apenas com aquele parceiro. Segundo a terapeuta de casais Michele Weiner-Davis:

“Quando um dos dois para de desejar, o outro se sente rejeitado, feio, indigno de amor. E essa dor corrói o relacionamento dia após dia.”
(The Sex-Starved Marriage, 2003)


3. O impacto emocional e relacional

Quando a falta de libido e a ausência de vida sexual se prolongam, surgem:

  • Baixa autoestima (sensação de não ser desejado)
  • Ressentimento e mágoas acumuladas
  • Isolamento emocional
  • Aumento de conflitos pequenos (que escondem problemas maiores)
  • Busca de validação fora do relacionamento (seja por traição física ou emocional)

Ao longo dos anos, o casal passa a:

  • Conversar apenas sobre tarefas do dia
  • Evitar contato físico além de abraços rápidos
  • Ter mais prazer com amigos, celular ou hobbies individuais
  • Dividir a casa sem intimidade, como colegas de apartamento

4. Como evitar esse cenário?

A) Fortaleça a comunicação íntima

🔹 Conversem abertamente sobre fantasias, desejos e frustrações sem acusar o outro. Use frases como:

  • “Sinto falta de quando fazíamos isso…”
  • “Eu me sinto rejeitado quando tento te tocar e você não quer. Podemos conversar sobre o motivo?”

🔹 Evite conversas durante discussões ou quando o outro está irritado ou cansado. Escolha momentos tranquilos.


B) Recriem o namoro

✔️ Façam atividades que não envolvam rotina (mercado, filhos, contas).
✔️ Saiam para jantar sem celular ou TV por perto.
✔️ Toquem-se mais: um estudo da Universidade de Zurique mostrou que abraços e beijos longos aumentam oxitocina, hormônio do vínculo, reacendendo o desejo (Ditzen et al., 2007).


C) Reduzam o uso de redes sociais no tempo a dois

✔️ Estabeleçam um “tempo offline” por noite para conversar, brincar, assistir algo juntos ou apenas trocar carícias.


D) Pratiquem o toque sem objetivo sexual imediato

✔️ Faça massagens sem esperar sexo.
✔️ Beije demoradamente.
✔️ Acaricie enquanto assistem algo juntos.
O desejo se constrói com pequenos estímulos repetidos.


E) Se necessário, busquem ajuda profissional

✔️ Psicólogos ou terapeutas sexuais ajudam a identificar causas emocionais e a reprogramar a relação íntima.
✔️ Endocrinologistas podem investigar causas hormonais.


F) Relembrem memórias eróticas juntos

✔️ Falem sobre momentos íntimos do passado.
✔️ Vejam fotos antigas de viagens e momentos felizes.
A memória afetiva reativa emoções prazerosas e pode estimular o desejo (Abdo, 2010).


G) Pratiquem exercícios físicos

✔️ Atividade física aumenta testosterona (em ambos os sexos), além de melhorar autoestima e disposição para o sexo.


5. Quando não há solução possível?

Segundo Weiner-Davis, se um parceiro não demonstra qualquer abertura para mudanças, mesmo após diálogos sinceros, o casal precisa considerar:

  • Viver como amigos, aceitando a ausência sexual (se ambos estiverem de acordo).
  • Buscar ajuda individual para lidar com a frustração, caso apenas um aceite essa vida.
  • Reavaliar a continuidade do relacionamento, se o desejo sexual e íntimo for essencial para sua felicidade.

A amizade é o alicerce de um relacionamento saudável, mas sem intimidade, ela vira apenas coleguismo. Sexo não é tudo, mas é uma expressão de desejo, afeto e conexão. E a falta dele, quando não conversada, pode transformar o amor em convivência prática e o parceiro em apenas “um bom colega de apartamento”.

🌟 “Casamento não é sobre encontrar alguém para dividir contas, mas alguém para dividir sonhos, pele, beijos, medos e alegrias.”


Bloco Extra: Quando tudo foi tentado e não há resultado: é hora de seguir em frente?

Apesar de todas as estratégias possíveis — diálogo, terapia, recriação de momentos íntimos, reconexão emocional e redução de distrações como redes sociais — nem sempre o relacionamento renasce. Isso ocorre por diversos motivos:

✔️ Diferenças profundas de valores e prioridades
✔️ Ausência de interesse real em mudança por parte de um dos dois
✔️ Problemas psicológicos ou traumas não enfrentados
✔️ Falta de amor ou atração, que já se rompeu há muito tempo


O dilema dos sonhos não compartilhados

Quando apenas um dos parceiros deseja:

  • Constituir família
  • Ter filhos
  • Construir intimidade conjugal verdadeira

E o outro:

  • Não demonstra interesse
  • Foge do tema
  • Coloca carreira, hobbies e vida individual acima da vida a dois
  • Rejeita de forma contínua e sem abertura para reconstrução

Surge um cenário de sofrimento silencioso, como explica a terapeuta de casais Esther Perel (2017):

“Quando um parceiro investe e o outro apenas tolera, quem investe acaba sentindo vergonha de desejar algo que o outro claramente não quer. E viver assim é morrer em vida.”


Os riscos de permanecer nesse relacionamento

✔️ Perda de tempo de vida fértil (em caso de filhos)
Especialmente para mulheres, o tempo biológico impõe limites claros. A espera por um parceiro que não compartilha o desejo de parentalidade pode se transformar em arrependimento, frustração e luto profundo pela família que nunca foi construída.

✔️ Baixa autoestima crescente
A sensação de rejeição constante corrói a autoconfiança. Muitos passam a se sentir indignos de amor ou de vida sexual plena.

✔️ Solidão a dois
Viver com alguém que não demonstra desejo ou interesse real causa mais solidão do que estar solteiro, pois reforça diariamente a ausência de afeto e conexão.

✔️ Perda de oportunidades de vida
Ao insistir em alguém que não quer os mesmos sonhos, perde-se tempo precioso para conhecer outra pessoa que compartilhe projetos semelhantes.


Quando a separação é a melhor solução

A psicóloga americana Michele Weiner-Davis, no livro The Sex-Starved Marriage, enfatiza:

“Quando há diálogo verdadeiro e o outro ainda assim não quer mudar, você precisa se perguntar: estou disposto a viver sem sexo, sem intimidade, sem planos em comum para o resto da vida?”

Se a resposta for não, e todos os esforços de comunicação e terapia falharam, a separação pode ser o caminho mais saudável para ambas as partes, pois:

✅ Liberta o parceiro que não deseja mudança, evitando cobranças eternas.
✅ Liberta você para viver seus sonhos reais, seja construir família, ter filhos ou encontrar alguém que compartilhe seus valores, desejos e visão de futuro.


Separar não é fracasso: é maturidade

Esther Perel reforça que:

“Terminar um relacionamento quando já não há desejo ou projeto compartilhado não é fracasso. É responsabilidade emocional consigo e com o outro.”

Muitos casais permanecem juntos por medo de solidão ou vergonha social, mas acabam vivendo décadas como colegas de apartamento, sem afeto, sem intimidade e, pior, sem coragem para recomeçar.


Conclusão complementar

Se você tentou todas as soluções possíveis, buscou terapia, investiu diálogo sincero e ainda assim não houve reciprocidade ou vontade de reconstruir, a separação deixa de ser uma tragédia e passa a ser:

🌟 Um ato de amor-próprio e liberdade
🌟 Uma oportunidade de viver seus sonhos sem esperar eternamente por quem não os compartilha

Lembre-se:

“Mais triste do que um fim é viver uma vida inteira esperando que o outro mude.”
(Baseado em conceitos de Esther Perel, Mating in Captivity, 2007)

Referências

  • Abdo, Carmita. Sexualidade Humana e seus transtornos. Atheneu, 2004.
  • Weiner-Davis, Michele. The Sex-Starved Marriage. Simon & Schuster, 2003.
  • Chapman, Gary. As 5 Linguagens do Amor. Mundo Cristão, 1992.
  • Journal of Sex Research (2017). Social Media Use and Sexual Satisfaction.
  • Ditzen, B. et al. (2007). Effects of Different Kinds of Couple Interaction on Cortisol and Heart Rate Responses to Stress in Women. Psychoneuroendocrinology.

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